Incumprimento do Exercício da Regulação das Responsabilidades parentais

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Todos os anos me proponho a mudar os meus hábitos e a fazer exercício físico.  “Ano novo, vida nova”, penso eu cá para os meus botões. Acontece que passa o ano e sinto que “afinal ainda não foi desta vez”. Fico sem perceber o porquê. Quando, afinal, a resposta é simples: não uso estratégias para integrar o novo hábito na minha rotina diária.

Ao lidar com os clientes faço este exercício de perceber o porquê de incumprirem com os seus objetivos ou as suas obrigações legais. A verdade é que há sempre um motivo:

  • “Ele recusa-se a pagar a pensão de alimentos porque acha que se a pagar eu vou usar o dinheiro para mim e não para a alimentação dos meus filhos” ou
  • “Ela nunca cumpre os horários estipulados no acordo de regulação simplesmente para me irritar e tirar do sério”.

De facto, quando o nosso foco está no lugar errado, acabamos por não cumprir as obrigações legais ou os objetivos a que nos propusemos. É o que acontece em muitos casos de regulação do exercício das responsabilidades parentais.

A regulação do exercício das responsabilidades parentais é o regime através do qual é fixada a residência do filho menor e a quem competirá a decisão relativa aos atos da vida corrente do menor. A residência da criança pode ser estabelecida relativamente a um dos progenitores ou a ambos, estando em causa, respetivamente, a residência/guarda total ou a residência/guarda alternada/partilhada. Este regime é fixado no caso de os progenitores não viverem como casal, isto é, no caso de estarem divorciados ou separados, ainda que habitem na mesma casa.

Se os progenitores estiverem de acordo, bastará apresentarem um pedido de homologação do acordo em qualquer Conservatória do Registo Civil, sendo que o processo será enviado ao Ministério Público, junto do tribunal do local onde a criança reside para que este se pronuncie sobre o mencionado acordo. Este documento é subscrito por ambos e são regulados os termos em que serão acordadas as responsabilidades parentais, nomeadamente com quem irá passar a criança a viver, em que períodos poderá estar o outro progenitor com o menor e como serão tomadas as decisões relativas à criança. É importante referir que as questões de particular importância sobre a criança constituem uma absoluta relevância para a saúde, bem-estar e desenvolvimento do filho, pelo que, deverão ser sempre tomadas por ambos os progenitores.

Contudo, a regulação do exercício das responsabilidades parentais (seja resultante de acordo ou de decisão) nem sempre é cumprida por um dos pais ou pela terceira pessoa a quem a criança tenha sido confiada, nomeadamente quanto à sua guarda/residência, aos convívios/visitas ou ao pagamento a título de pensão alimentos.

Assim, estando em causa um incumprimento culposo ou não culposo, o tribunal pode, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou do outro progenitor, requerer as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação em multa daquele que esteja a incumprir, fixando-se uma indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos. Este requerimento deve conter, quando possível, a data a partir da qual se verificou o incumprimento, a totalidade do valor em dívida, a descrição dos factos e os termos da regulação que estiverem a ser violados. Depois do requerimento chegar às mãos do juiz, este convoca os pais para uma conferência, onde podem requerer a alteração do que se encontra estipulado na regulação do exercício das responsabilidades parentais, desde que se encontrem acautelados os interesses da criança.

Ora, quando está em causa o incumprimento pelo progenitor que prestava a pensão de alimentos, o tribunal deve tomar conhecimento para que este proceda à cobrança coerciva através dos meios previstos na Organização Tutelar de Menores, designadamente através do desconto no vencimento do progenitor ou da dedução de rendas, pensões, comissões, percentagens, gratificações, entre outros. A falta de pagamento da pensão de alimentos consubstancia-se, ainda, num crime de violação de obrigação de alimentos, punível com pena de prisão até 2 anos ou com multa até 240 dias.

Porém, a violação deste dever nem sempre é culposa. Aliás, em muitos casos o progenitor deixa de pagar a pensão de alimentos devido à sua incapacidade económica decorrente, por exemplo, da sua situação de desemprego, doença, incapacidade, entre outros. Nestes casos, através de requerimento submetido ao Tribunal onde foi fixada a pensão de alimentos, pode ser acionado o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores e é o Estado que assegura o pagamento da pensão até que o progenitor reúna as condições necessárias para efetuar o pagamento em falta.

No entanto, o incumprimento do pagamento de pensão de alimentos por um dos progenitores não é a única causa de incumprimento do exercício de responsabilidades parentais. Nesse sentido, existe também incumprimento quanto ao regime das visitas. Isto acontece porque a atribuição de residência a apenas um dos pais pode provocar a rutura de laços entre o progenitor a quem não foi concedida a guarda/residência e o seu filho.

Por outro lado, o incumprimento do regime de visitas pode também surgir por parte do progenitor a quem foi concedida a guarda total da criança, nomeadamente, quando este impede o progenitor não guardião de visitar a criança.

Assim, em caso de incumprimento do exercício das responsabilidades parentais as sanções aplicadas são:

  • a condenação em pena de multa,
  • a possibilidade de indemnização ao menor, progenitor requerente ou a ambos ou
  • a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais.

 Por este motivo, os nossos Tribunais cada vez mais têm optado pela residência partilhada entre ambos os progenitores, para que haja, assim, um convívio entre os pais e o menor e um maior interesse pelo bem-estar da criança.

Neste sentido, é importante não esquecer os direitos da criança cuja violação ou desrespeito permite antever uma situação de prejuízo ou perigo, devendo, nesses casos adotar-se medidas de proteção que afastem o perigo para a saúde, segurança, formação moral ou educação da criança, sempre visando a prossecução do seu desenvolvimento integral.

Deste modo, o Código Civil prevê, não só a inibição do exercício do poder paternal, aplicável nos casos mais graves de violação culposa dos deveres parentais que causaram sérios prejuízos ao filho, mas também medidas limitativas para os casos em que se observe o perigo, mas não seja adequada a inibição, nomeadamente para situações em que não se observe a culpa do progenitor.

Para avançar com uma ação de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais, importa fazer prova da obrigação incumprida pelo progenitor. Se em causa está o incumprimento da pensão de alimentos, vale a pena discriminar todas as prestações em falta e as respetivas datas, assim como das despesas medicamentosas e extracurriculares que ficaram por pagar.

Valerá também a pena relembrar o outro progenitor que os filhos são para sempre e que o principal motivo das obrigações decorrentes de um acordo será sempre o bem-estar e o superior interesse da criança.

Despeço-me com estima, até breve

Margarida Ferreira Pinto

Para saber mais sobre Direito da Família, sugerimos que nos contacte ou consulte estas páginas:

Regime Geral do Processo Tutelar Cível

Código Civil

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