Mais do que o que é dito numa sala de julgamento, é importante observarmos o que o sujeito processual interpelado está a manifestar com o corpo.

Mas afinal o que é a linguagem não verbal?

Para além das palavras, também a audição, a visão, o cheiro, o paladar e o toque contribuem para a perceção humana.

A comunicação não verbal influencia inevitavelmente a decisão jurídica uma vez que o art. 127º do Código de Processo Penal estabelece o Princípio da Livre Apreciação da Prova: “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”

Por trás das regras da experiência e da livre convicção do julgador, está inevitavelmente a linguagem não verbal, por ser algo inerente à pessoa, independentemente da vontade.

Tendo o processo penal como objetivo principal a descoberta da verdade material, perante a inquirição de uma testemunha ou ofendido, precisamos de saber se o que o seu corpo manifesta corresponde àquilo que está a ser dito.

Por outro lado, exige-se que a confissão dos arguidos seja feita de forma livre, integral e sem reservas. Temos, por isso, de perceber se, quando o arguido está a confessar os factos, a confissão está a ser proferida nessas circunstâncias.

Num julgamento de processo penal, é normal que tanto as testemunhas, como os ofendidos ou os arguidos, possam paralisar se não compreenderem a pergunta colocada ou, se por outro lado, ficarem constrangidos ou atrapalhados.

Perante uma acareação, é a linguagem não verbal que pode esclarecer qual dos dois arguidos está a dizer a verdade.

Para tal é essencial colocar a pessoa numa situação confortável, perceber quais são os seus movimentos normais e como se comporta. É a partir das manifestações de conforto (que nos indicam que aquilo que a pessoa está a falar corresponde à verdade), que observamos melhor as situações de desconforto. Ou seja, se a pessoa está a dizer alguma coisa e tem um comportamento que demonstra esse desconforto, em princípio a pessoa estará a mentir.

É também importante conhecermos os comportamentos padrão da pessoa inquirida já que estes são os comportamentos que normalmente assumimos por estarmos à vontade com eles.

Alguém que mude de forma repentina o seu comportamento perante uma determinada resposta pode chamar-nos logo à atenção.

Vejamos estes exemplos:

Quando uma pessoa está com um pé levantado ou as pernas cruzadas, significa que não está em posição de fuga. O nosso sistema límbico dá ordens ao corpo para nos colocarmos naquela posição quando estamos confortáveis. Isso significará que a pessoa está a falar a verdade.

Por outro lado, se estamos de braços afastados relativamente ao corpo, isso poderá significar que a pessoa está confortável e em princípio estará a falar a verdade.

Num julgamento de processo penal, os braços abertos, em vez de estarem encolhidos pode ajudar-nos a interpretar e percecionar o sujeito que adota a posição de elevado nível de dominância. Esta perceção pode assumir elevada relevância num julgamento de vários arguidos em que procuramos saber quem é o líder do bando.

A linguagem não verbal não pode, de todo, ser o fator decisivo, mas ajuda-nos muito a perceber de forma imediata onde estará a verdade.

Pessoalmente, eu utilizo a observação da linguagem não verbal logo nas primeiras consultas que faço. É inevitável que depois de aprendermos a ler a linguagem não verbal do ser humano, não haja gestos e comportamentos que nos saltem à vista e que associemos a determinados significados.

Para além de toda a complexidade da matéria de direito que possa estar a ser debatida, é também por tudo isto que um julgamento pode ser surpreendentemente interessante!

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