Posso ser responsabilizado por infetar um idoso com COVID-19?

Com a pandemia provocada pela COVID-19, debatemo-nos sobre a eventual lesão a bens do interesse da personalidade da pessoa.

Este tema surge relacionado, por exemplo, com a questão da necessidade de opção em situações limite, nas quais é preciso fazer escolhas trágicas, quando por exemplo, entre dois ventiladores, só há um disponível. Quais os critérios de escolha? Podem as pessoas ser avaliadas quantitativamente? É justo optar-se pelo doente que tem maior esperança de vida e que é o mais jovem?

Por outro lado, uma das possibilidades da declaração do Estado de Emergência é a restrição de algumas liberdades como a liberdade de deslocação ou a liberdade de manifestação. Nesse sentido, muitos se questionam se podem exercer os direitos fundamentais num contexto de pandemia.

Os direitos de personalidade são, no domínio do direito privado, coincidentes com alguns direitos fundamentais regulados nos artigos 24º, 25º e 26º da Constituição, nomeadamente: a vida, a integridade física, a moral, o direito à liberdade.

O art. 18º, nº1 da nossa CRP estabelece que “Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são diretamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.”

Apesar do nosso Código Civil ser anterior à Constituição da República, a Constituição fundamenta e impõe um reconhecimento de direitos de personalidade no direito privado.

No âmbito das circunstâncias excecionais que vivemos atualmente, muitos se questionam sobre a eventual responsabilidade de infeção de uma doença fatal.

Ou seja, há quem procure saber se, quando alguém transmite o vírus e essa situação vem a provocar a morte da pessoa infetada, isso pode ser considerado no direito civil uma lesão do direito à vida.

Quanto a este ponto, não há uma resposta taxativa, cada caso é um caso.

Importa antes de mais saber se, no caso em apreço, a transmissão do vírus é em si uma causa adequada a provocar aquele resultado. Talvez para a generalidade das pessoas não seja, mas sem dúvida que nos grupos de risco o é.

Por outro lado, é relevante saber se o tipo de dever violado pela pessoa que provocou a infeção visava justamente proteger a vida.

Quanto à culpa, tem de se saber se o disseminador representou a possibilidade de vir a infetar alguém e ainda assim se conformou com essa eventualidade.

E, claro, não podemos deixar de perceber se a infeção provocou lesão grave com sequelas permanentes ou não no doente e se ele já estaria ou não com essas lesões antes da infeção.

O Código Civil não fixa um valor para o dano morte, tudo vai depender de uma série de fatores, tais como: se a pessoa era saudável ou não até esse momento, se tinha alegria de viver, quais os danos reflexos que a morte da pessoa por COVID causou imediatamente nos parentes, ascendentes e descendentes elencadas no nº2 do art. 496º do Código Civil.

Perante a realidade inédita que vivemos e, porque todos os cuidados que temos com quem convivemos são poucos, será sempre melhor “prevenir do que lamentar”.

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