A prisão preventiva e outras medidas de coação

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A prisão preventiva é a mais grave das medidas usadas para prevenir alguém de persistir num ato considerado crime ou para proteger eventuais vítimas, como acontece nos casos de crime de violência doméstica. Mas a lei tem outras medidas de coação. Conheça quais são e quando se aplicam.

O momento mais desafiante do meu negócio até hoje, sem contar com os primeiros 6 meses? Com toda a certeza que foi a pandemia. Cada um de nós, à sua maneira, se sentiu preso. A possibilidade de, de um dia para o outro, ficar sem liberdade é terrível. Recordou-me aquele dia em que estava de férias e fiquei presa num elevador. Apeteceu-me dar pontapés na porta. Gritar. Mas sabia que ninguém me iria ouvir.

Vejo esses sentimentos nos clientes que me procuram quando foram constituídos arguidos e estão a aguardar que lhes seja aplicada alguma medida de coação. “E se eu for preso preventivamente?”, “É certo que vou preso?”, “O que são medidas de coação?”, perguntam-me eles, em total desespero.

Para evitar a fuga à Justiça de alguém que foi indiciado num crime ou a continuação da atividade criminosa, a lei preveniu-se e criou medidas nesse sentido – são as medidas de coação. Destas a mais conhecida do público é a prisão preventiva, mas existem outras de menor gravidade e que também têm o mesmo objetivo.

Medidas de coação: o que são e para que servem?

As medidas de coação são, tal como está descrito na lei, os meios que limitam a liberdade pessoal ou patrimonial de uma pessoa com o objetivo de garantir que esta fica contactável e que não repete ou continua com o ato criminoso.

Quem decide se são aplicadas as medidas de coação?

As medidas só podem ser determinadas pelo juiz de instrução (nas fases de inquérito e de instrução) e pelo juiz do processo (nas fases posteriores).

É o Ministério Público que pede a aplicação das medidas de coação e o arguido tem de ser ouvido pelo juiz antes de este tomar uma decisão.

Quando se aplica as medidas de coação?

O Ministério Público só pode pedir a aplicação das medidas de coação quando se verificam as seguintes condições:

quando a pessoa é constituída arguida e já existe um processo criminal instaurado;
quando há indícios da existência de um crime;
quando, considerando a natureza e as circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, há o perigo de que o arguido continue com a atividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e tranquilidade públicas;
quando há a fuga ou o perigo de fuga do arguido:
quando há o perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo:
quando há o perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas ou de continuação da atividade criminosa;

As medidas de coação só podem ser aplicadas a uma pessoa constituída arguida e devem ser proporcionas e adequadas à situação.

Que medidas de coação existem?

A par da prisão preventiva, a medida de coação mais grave, existem ainda outras seis de menor gravidade.

O termo de identidade e residência

O termo de identidade e residência consiste em três deveres que o arguido tem de cumprir:

obrigação de identificação e indicação da residência;
obrigação de manter a residência, não podendo dela se ausentar por mais de cinco dias; se tiver de se ausentar ou mudar de residência terá de comunicar nova morada ao processo;
obrigação de comparecer junto da autoridade competente e de se manter à sua disposição sempre que a lei o obrigar ou for devidamente notificado para o efeito.

Esta medida é a menos grave e é sempre cumulável com as restantes medidas de coação. E ao contrário de todas as outras, pode ser aplicada por qualquer autoridade judiciária ou policial, isto é, pelo Ministério Público e pelas polícias.

A obrigação de apresentação periódica

Esta medida de coação só pode ser aplicada pelo juiz e consiste na obrigação de o arguido se apresentar a uma entidade judiciária ou a um órgão de polícia criminal em dias e horas preestabelecidos. A condição para que seja aplicada é a de que a pena do crime imputado ao arguido seja a da prisão de máximo superior a seis meses.

A obrigação de apresentação periódica pode ser cumulada com outra medida de coação, exceto com a da prisão domiciliária e a da prisão preventiva.

A caução

Esta medida consiste na imposição de uma garantia patrimonial ao arguido no intuito de assegurar o cumprimento dos seus deveres processuais. Tal como as outras medidas, também a caução só pode ser imposta pelo juiz e desde que a pena do crime imputável ao arguido seja a da prisão.

Para se apurar o valor da caução, o juiz segue os seguintes critérios estabelecidos na lei:

os fins de natureza cautelar a que se destina;
a gravidade do crime;
o dano causado pelo crime;
a condição socioeconómica do arguido.

O pagamento da caução pode ser feito através de depósito, de penhor, de hipoteca, de fiança ou fiança bancária. No caso de o arguido não pagar, pode haver o arresto preventivo do seu património.

E no caso de o arguido não cumprir com os seus deveres processuais, como faltar injustificadamente ao ato processual, a caução é quebrada e o valor reverte a favor do Estado.

Por outro lado, há a possibilidade de a caução ser substituída por outra medida de coação, também por decisão do juiz e perante a prova de que o arguido não tem meios de a prestar.

E pode ser cumulada com outra das medidas, exceto com a da prisão domiciliária e a da prisão preventiva.

A suspensão do exercício de profissão, de função, de atividade e de direitos

Esta medida é aplicada quando o crime imputado ao arguido é punível com pena de prisão de máximo superior a dois anos e há a possibilidade de ser decretada a interdição do exercício de profissão, de função, de atividade e de direitos como efeito do crime.

Assim, e perante aquela possibilidade, o juiz decide que suspensões impõe ao arguido:

a suspensão do exercício de profissão, de função ou de atividade, pública ou privada;
a suspensão de responsabilidades parentais, da tutela, da curatela, da administração de bens ou da emissão de títulos de crédito.

Tal como as outras medidas de coação, também esta pode ser cumulada com outras.

A proibição de permanência, de ausência e de contactos

Quando existem fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos, o juiz pode impor ao arguido restrições à liberdade de movimentos e de se relacionar para prevenir a atividade criminosa e a perturbação da ordem e tranquilidade públicas, e ainda para proteger as vítimas (por exemplo, nos casos de violência doméstica).

Que restrições?

a proibição de permanecer, ou de permanecer sem autorização, na área do local ou da residência onde o crime tenha sido cometido ou onde habitem os ofendidos, os seus familiares ou outras pessoas sobre as quais possam ser cometidos novos crimes;
a proibição de se ausentar para o estrangeiro, ou de se ausentar sem autorização;
a proibição de se ausentar, ou de se ausentar sem autorização, da povoação, freguesia ou concelho do seu domicílio, exceto para lugar predeterminados, nomeadamente o lugar do trabalho;
a proibição de contactar, por qualquer meio, determinadas pessoas ou de frequentar certos lugares;
a proibição de adquirir ou usar armas, ou outros objetos e utensílios que detiver, capazes de facilitar a prática de outro crime, ou a obrigação de os entregar dentro do prazo que for fixado;
a obrigação de o arguido se sujeitar, mediante prévio consentimento e em instituição adequada, ao tratamento de dependência de que padeça e que tenha favorecido a prática do crime.

Esta medida de coação também pode cumular com outras.

A obrigação de permanência na habitação ou prisão domiciliária

Tal como o título indica, esta medida de coação consiste na obrigação de o arguido permanecer no seu domicílio ou em outro onde ao momento resida, ficando proibido de ali se ausentar, salvo se a tal for autorizado.

Por se tratar de uma das medidas de coação mais graves, a par com a prisão preventiva, o juiz só a aplicará quando as anteriores referidas acima se revelarem insuficientes ou inadequadas, e pode recorrer á vigilância eletrónica para assegurar que o arguido cumpre a sua obrigação.

Finalmente, a mais gravosa das medidas de coação, a prisão preventiva. Chegar aqui significa que todas as outras medidas se mostraram insuficientes, ou inadequadas na prevenção da atividade criminosa e da perturbação da ordem e tranquilidade públicas, e na proteção das vítimas.

A prisão preventiva: quando se aplica?

Para garantir que o processo se desenvolva dentro da normalidade, e uma vez que o arguido não foi condenado pela prática do crime que lhe é imputado (nem há certeza de que o seja) mas é urgente prevenir que persista na atividade criminosa e proteger eventuais vítimas, o juiz pode impor a prisão preventiva.

Para que o juiz determine esta medida é necessário ocorrer uma destas condições:

haver fortes indícios de prática de crime punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos;
haver fortes indícios de prática de crime que corresponda a criminalidade violenta;
haver fortes indícios de prática de crime de terrorismo, ou que corresponda a criminalidade altamente organizada punível com pena de prisão de máximo superior a três anos;
haver fortes indícios de prática dos seguintes crimes, puníveis com pena de prisão de máximo superior a três anos: ofensa à integridade física qualificada; furto qualificado; dano qualificado; burla informática e nas comunicações; recetação, falsificação ou contrafação de documento; atentado à segurança de transporte rodoviário;
fortes indícios da prática de crime doloso de detenção de arma proibida, detenção de armas e outros dispositivos, produtos ou substâncias em locais proibidos ou crime cometido com arma, nos termos do regime jurídico das armas e suas munições, puníveis com pena de prisão de máximo superior a três anos;
a entrada ou estada de forma irregular no território nacional, ou alguém que tenha um processo de extradição ou de expulsão.

Sabe, tal como lhe transmiti no início deste artigo, naquele dia, fechada no elevador, senti-me completamente perdida e impotente. Fui inundada por uma tremenda sensação de injustiça, que me fez ficar sem chão por não ter como sair dali. Por mais que gritasse, não havia ninguém para me ouvir. O mesmo voltou a acontecer no confinamento decretado durante a pandemia covid-19. Mas aí, já éramos muitos a passar pelo mesmo, e, por isso, eu tinha como me sentir mais ou menos compreendida.

No seu caso, provavelmente sente-se incompreendido e, em certa medida, revoltado. Mas deixe-me dizer-lhe que há quem esteja aqui para ouvir o seu “grito” e ajudá-lo a recorrer da medida de coação que lhe foi aplicada. Aliás, há quem tenha como missão, defendê-lo a si e ao maior bem da humanidade: a Liberdade.

Despeço-me com estima, até breve

Margarida Ferreira Pinto

 


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